Sento-me quieta, sem direcções, perdida. Debaixo de mim inconfortavelmente acomoda-se um banco de cimento, frio, gelado, cortante. Não sei onde estou mas decerto não estranho este lugar. Talvez já o tenha percorrido em sonhos largos, vazios, de pedra. Tudo é sonhado a preto e branco, num filme rodado. Não sei de onde veio a fonte de granito que jaz perante o meu olhar, ou de onde veio a água que dela insiste em brotar, molhando a calçada desbotada, onde decerto muitas crianças, agora convertidas em pequenos anjos de pedra, insistiram em brincar, ignorando as suas insistentes mamãs a chamar. E talvez já a fonte tenha secado quando os meus pés decidirem obedecer-me, talvez a água tenha já recomeçado a cair, segurando nela a sofreguidão fresca de quem anseia por uma gota.
Nada fala senão o meu silêncio. Os ciprestes negros devoram os meus olhos, e já me esqueci de deles os desviar. Inalo um ar irrespirável, pesado como se o céu tivesse ardido e labaredas laranja o tivessem engolido, e erguem-se fantasmas cegos à minha frente, como flores vermelhas que brotam perante lágrimas das nuvens.
Quem sou eu? De que são feitos estes sonhos macabros que teimo em sentir? Penas de cristal acomodam-se à minha volta e canso-me mil e uma vezes. Atravessam-me espectros, nesta cidade perdida de um pesadelo qualquer, neste redondo plano infértil de promessas quebradas. Quero mover-me mas os meus sentidos repousam nalgo imaterial, e na calma que se perpetua à minha volta sinto-me incapaz de contrair um músculo sequer, temendo ofender o vazio denso.
Nada fala senão o meu silêncio, senão a minha consciência infindável, o meu eu que nada é. E neste pátio antigo que já antes revivi, temo deparar-me comigo. Pois que traumas me infestam para que tão conspurcada esteja que já nem me reconheça na água congelada da fonte?
Nada fala senão o meu silêncio, e acordo de novo para me encontrar no mesmo sonho, desperto para uma outra cidade, uma outra concepção da realidade que eu componho.
28.1.12
27.1.12
alvorada em papel fotosensível
uma fotografia quente
de pingos de luz numa janela sem vidros
porque a manhã que cresce toca-se
engole-se em partículas que atravessam
apenas o desmovimento da sombra,
existe.
apenas o movimento imperceptível da luz
lava,
o que existe.
limpa-escuro, manhã-dia.
de pingos de luz numa janela sem vidros
porque a manhã que cresce toca-se
engole-se em partículas que atravessam
apenas o desmovimento da sombra,
existe.
apenas o movimento imperceptível da luz
lava,
o que existe.
limpa-escuro, manhã-dia.
26.1.12
Estrada de Salomenia
Os caminhos do sol traçam-se através de linhas desfocadas de luminosidades interiores e gotas de suor. Rasgam as roupas de quem agora será nú por inteiro absorvendo a parca água num oceano.
10.1.12
Porque é que nos custa encarar a vida de frente quando ela se estende perante nós lânguidamente? Tal como o sol que nos queima as faces e enche de lágrimas os nossos olhos, mas nos abraça no seu calor, que nos ilumina na sua rouquidão; assim aquilo que somos se revela perante nós, atormentando-nos com a sua certeza, alimentando-nos com a sua paixão.
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