24.2.13

existe uma minúscula gota que rasga a transparência. em vidro filtro-me, existe chuva. percorro a escrita de perfeito. percorro-a. a ponta da língua sorve o conceito, e o que é ele afinal? um toque um grão de água (na minha testa corre). como posso aspirar respirar um definido dois pontos isto. ? . eu contenho e absorvo em mim o ser orvalho pré-caído no abismo. eu lavo a pele a beber o raspar marinho de lágrimas. como posso eu agarrá-lo numa concisa tipografia de ser tinta? como poderia desconstruí-lo tapando a embalagem na secção dos congelados? violá-lo é torná-lo Não.

a perfeição não existe e existir também não tão-pouco não ou tão ou pouco existe. que é inexactamente o mesmo que existir. indefinido indefine o indefinível. 

uma minúscula gota continuará a rasgar a transparência se eu esquecer o conceito de gota e apagar toda a palavra transparência (diz-me que não. tudo pode ser. tudo pode não ser. diz-me que sim)

e. ela. dentro. ela a existir em dentro si mesma as cores de um outro universo que existe em mim que absorvo o paladar inócuo de mundos num toque de língua a sorver muito menos mais que o conceito. e a perfeição existe e existir também tão-quanto a sua inexistência é realmente irreal. e o definido é a heresia de definir a utopia. que contém e corrige a harmonia. que é a maior das entropias. e que nada do que escrevi seja alguma vez verdadeiro ou falso.

no vidro colado à gota. vês?


27.1.13

Entropia

Se nesse nascer e morrer eu ressuscitar e melhorar cada partícula de mim, cada partícula que me constitui, talvez eu queira de facto morrer.
Na minha ânsia não encontro como acalmar o meu insuperável e insuportável cepticismo e desse modo não me contento com o que sou e procuro estupidamente por decisões, infrutiferamente por respostas.
Oxalá alguém encontrasse em mim uma palavra inspiradora ou um mito, um orgasmo do cosmos, que o inspirasse a criar algo perfeito. Tornaria perfeita a minha obra. Tornaria valiosa a minha existência.
Importa-me concretamente o que sou pois ao não encontrar outra maneira de o ser tento ao menos compreender o porquê de ser assim. E tu? Não te incomoda a indefinição? Não te atrapalha o nascer e morrer e não saber nada e não ser nada senão pó, pó que um dia constituiu estrelas e planetas e átomos; somos apenas átomos e como é que átomos podem pensar tanto?
Se eu conseguisse fragmentar cada célula que me constitui cada molécula cada átomo cada electrão e dissecasse cada neurónio do meu corpo talvez compreendese que acalmar o meu corpo não é uma necessidade e sim agitá-lo, gerir a entropia que me atormenta.
Entropia. Caos. Vida e Morte.
Oxalá alguém encontrasse em mim uma frase inspiradora, uma obra, um êxtase da eternidade, que o levasse a criar algo perfeito. Tornaria perfeita a minha vida. Tornar-me-ia algo definido e cada partícula que me constitui seria matéria à sua maneira.

4.12.12

de que importa concretamente quem somos? de que importa a busca do que não somos, nos move, implacável, de que importa? se procuramos o inconcreto, se queremos mais do que o impossível, se nos desventramos na análise científica de interiores fechados em exterior. matéria, reles matéria somos, poderemos mais?

o mito é o orgasmo dos cosmos. nós, os cosmos. morremos morremos morremos A MORTE É A VIDA, MAIS QUE A VIDA

peço-te então que nasças, e morras e nasças e morras cada vez mais.

28.11.12

morremos e ficamos
simultaneamente
morremos nós e as nossas ideias permanecem
nas nossas consciências.
o problema reside aí, na transcrição apressada de pensamentos
que não podem ser descritos, sumariados em palavras, por mais caras que estas sejam
o que se sente
sente-se
descreve-lo é tirar-lhe o sentido
egoistamente
mente então ao criares projecções poéticas de ti mesma
nada poderá ser exactamente o que és
nem ninguém poderá concretamente ler quem sou.

8.11.12

a utopia jaz.
se não estás eu não estou.
não existas se por ti não é.
poia és ainda dos vivos? espero aqui por ti?
ou enterramos juntas o projecto de projecção dela, utopia.
morremos? ou ficamos? pregunto-te

?

18.10.12

deixa que eu flua

Derreto-me continuamente, pois claro, deixo que este subatómico eu se assuma e liberto-me, escapo-me das paredes que não possuo, que deixei de possuir, repentinamente - sem que desse conta de tal.
E sou livre de uma vez, vou alternando entre os estados físicos que me convêm mais ao momento, sou livre e consigo respirar embora todos os odores e vapores se tenham já consumido (e assim sendo já nada tenho para inspirar, já nenhuma realidade me cativa e interessa, toda a fusão entre o eu e o tu se desvaneceu).
E nesta prisão redonda a que uns chamam de planeta Terra, outros apenas crânio, cérebro, mente, alma, razão, nestes conceitos supérfluos, ideias já muito pré-concebidas da realidade, de uma qualquer realidade, entorpeço-me, caio, pereço sem que morra de facto. Até que um dia, por explodir todo o meu ser, toda a minha consciência, por todas as partículas que sou se tornarem uma, por libertar toda a energia trivial que guado estupidamente, bem contida e encafuada nos recônditos da minha pessoa, olho para cima e finalmente vejo - não com os olhos mas com a minha profunda e confusa existência.


27.8.12

quero que me continues

cheiros. dilantando memórias em fragrancias imperceptíveis do que em espaços se perdeu.
uma sala a céu aberto: uma só parede sem vértices. uma só e contínua irregularidade fechada mas aberta, a céu. a memória dos cheiros está incrustada na parede, não possuis a parede, o ar nunca foi teu. penetrou-te indiferente, fundiu-se no mais profundo molecular e atómico que temes ser, abandonou-te ao corte rasgado da recordação acutilante. o NUNCA MAIS.  irreversívelmente embriagado pelo perfume do antes, cais num chão que te coloca o céu visível, mais longe, longe, esta parede disforme que te cerca, que te corrói, que te come.

diz-me como escaparás. conta-mo como se me descascasses o craneo.

14.7.12

Utopos.
Conceito inconcebível enquanto parte de um todo, englobando toda a envolvente material.

o sol congela na linha do horizonte sem que a luz esmoreça de rompante. o conceito inconcebível concebe-se.
utopia. algures num outro lado do planeta um calor abrasador retorna a escorrer suor nos corpos estafados.
a continuidade das coisas mantém-se constante imutável transparente permanente camuflada.
utopia. não gravamos cheiros na memória, antes gravamos memórias nos cheiros.

28.5.12

Curvas planas côncavas em traços desalmados e quase nada humanos. Labaredas partículas minúsculas que se convertem em partículas minúsculas espaços vazios não preenchidos e somos carne e osso somos vida e pequenos minúsculos espaços vazios. O oxigénio mantém-se consumido quase diluido na atmosfera nauseabunda que tresanda a nós destas paredes caiadas já um pouco lascadas paupérrimas e sensaboronas e pode ser que o quarto sem janelas cresça iluminado aquando do nascer das pequenas partículas reactoras. Pensar que dentro de nós se perpetua a impensável inimaginável inconcebível energia para despoletar o rebentar de uma bomba atómica que arrasaria todo o verde que o mundo vai rareando, será legítima essa associação? Mas enquanto as curvas planas côncavas suadas em traços desalmados frenéticos nada humanos e inadaptados são percorridas num arrepio solene tudo se consome e as partículas minúsculas que não passam de pequenos minúsculos espaços vazios bastam para que se consuma o pobre desalento vítreo das nossas consciências pesadas.